Sou médico veterinário e desde o início da minha carreira me perguntava o porquê dos medicamentos veterinários, tributação sobre as clínicas e outros serviços executados pelos colegas de classe serem bem mais caros em relação aos valores aplicados sobre outros profissionais da saúde, como dentistas ou fisioterapeutas? Por que esta diferenciação, se desde a década de 1990 a medicina veterinária é considerada como sendo da área de saúde?
É comum pensar que a medicina veterinária trata somente dos animais, no entanto todas as medidas implantadas na saúde animal têm como objetivo principal a preservação da saúde humana, visto que desta forma, a prevenção das doenças de origem animal que acometem o ser humano torna-se mais efetiva. Estamos falando de muitas doenças como a raiva, ebola, tuberculose, toxoplasmose, leptospirose, sarna, febre amarela, dengue, tifo, malária, doença de Chagas, etc. É importante ter cuidado com animais doentes e com os produtos de origem animal. Até mesmo a Covid-19 é uma pandemia que nasceu de uma zoonose e virou uma doença humana.
Então, se o veterinário atua no controle de doenças e ainda garante a segurança alimentar, por meio do controle sanitário feito na produção, na defesa sanitária ou na inspeção, o que justifica essa tributação maior para a classe? O porquê de isso acontecer está no teto que abriga a medicina veterinária. Apesar do profissional ser reconhecido como da área de saúde, ele ainda responde ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e não ao Ministério da Saúde. O medicamento Omeprazol, por exemplo, feito com a mesma composição e no mesmo laboratório, sendo um produto veterinário, ficará em média 50% mais caro. E essa tributação maior se estende para a ração, clínicas, serviços, enfim, para toda a cadeia.
Mudanças são necessárias
Este enquadramento da profissão precisa mudar e com mobilização, gestão e representatividade, podemos sim, colocar a Medicina Veterinária no “Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde” (CNES). Desta forma iremos desonerar os profissionais, os serviços e produtos incluídos na cadeia da medicina veterinária. Irão se beneficiar os animais, os criadores de pets, os pecuaristas, e consequentemente, a cadeia alimentícia que pode refletir a desoneração no preço dos alimentos. Além disso, conseguiremos democratizar o atendimento médico veterinário, fundamental para a saúde pública.
Não podemos deixar de ressaltar que as zoonoses representam 75% das doenças infecciosas emergentes no mundo; 60% dos patógenos humanos são zoonóticos e 80% dos patógenos que podem ser usados em bioterrorismo são de origem animal, o que aumenta a importância e responsabilidade da saúde pública veterinária.
O aumento do contato entre a população humana e os animais domésticos e silvestres, ocorridos nos últimos anos em decorrência dos processos sociais e agropecuários, resultou na disseminação de agentes infecciosos e parasitários para novos hospedeiros e ambientes, implicando em emergências de interesse nacional e internacional.
Valorização dos profissionais
Em tempos de Covid-19, médicos veterinários também têm se destacado no trabalho e muitas vezes na liderança de equipes multidisciplinares que atuam nos laboratórios oficiais, biotérios; universidades e institutos de pesquisa com os testes de diagnóstico da doença; o desenvolvimento de tratamentos e vacinas humanas; os testes de novos modelos de testagem e respiradores, e o auxílio às vigilâncias epidemiológicas. O caminho é a indissociabilidade entre saúde pública, veterinária e ambiental, como o melhor método para prevenir e responder aos surtos e pandemias.
A valorização da medicina veterinária se mostra latente, é necessária para acompanharmos as mudanças sociais, econômicas e sanitárias. Você, amigo veterinário, que quer se juntar a nós, seja bem-vindo. As transformações na profissão precisam acompanhar os novos tempos.
Ulisses Guimarães
Médico Veterinário, Produtor Rural e Gestor Público
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